Dança de Coco
Dança de Coco na Capoeira Brasileira: Raízes, Ritmo e Resistência
A Dança de Coco, manifestação cultural afro-brasileira típica do Nordeste, compartilha com a capoeira uma história de resistência, ancestralidade e celebração comunitária. Embora sejam expressões distintas, suas conexões revelam a riqueza da diáspora africana no Brasil, onde música, dança e luta se entrelaçam como formas de preservação identitária. Este ensaio explora a relação entre a Dança de Coco e a capoeira, destacando suas origens, estruturas e significados culturais.

1. Origens Históricas: Do Coco à Capoeira
A Dança de Coco surgiu no litoral nordestino, especialmente em estados como Alagoas, Pernambuco e Ceará, entre comunidades quilombolas, pescadoras e trabalhadoras rurais. Seu nome deriva do uso de cocos batidos como percussão ou do termo “coco” (do quimbundo kôkô, “quelônio”), associado a movimentos circulares. Assim como a capoeira, nasceu da criatividade negra e indígena durante a escravidão, servindo como espaço de resistência e afirmação cultural. Enquanto a capoeira misturava luta e dança para disfarçar treinamentos de defesa, o Coco era uma celebração coletiva que unia trabalho (como quebra de coco) e festa, mantendo vivas tradições rítmicas africanas.
2. Estrutura e Elementos do Coco
A Dança de Coco organiza-se em roda, com participantes batendo palmas, cantando versos improvisados e executando passos sincopados. Seus elementos-chave incluem:
- Percussão: Usa cocos batidos, ganzás, pandeiros e zabumbas, criando ritmos como o coco de embolada (rápido) e o coco de praia (lento).
- Cantigas: Versos em formato de chamado e resposta, temáticas cotidianas, amorosas ou políticas, similares às ladainhas da capoeira.
- Passos: Movimentos como o “trupé” (arrastar os pés) e giros, que dialogam com a ginga capoeirística.
A simplicidade dos instrumentos e a ênfase na participação coletiva refletem a mesma lógica comunitária das rodas de capoeira.

3. Diálogos com a Capoeira: Ritmo e Ancestralidade
Embora sejam práticas independentes, Coco e capoeira coexistem em contextos culturais afro-brasileiros:
- A Roda como Símbolo: Ambas ocorrem em círculos, representando união, igualdade e ciclicidade africana.
- Improvisação Poética: As cantigas de Coco, como os corridos da capoeira, usam métrica e humor para transmitir saberes e críticas sociais.
- Ritmos Cruzados: O coco de roda e o toque de Angola na capoeira compartilham cadências lentas e hipnóticas, ligadas ao ijexá do Candomblé.
Mestres como Mestre João Pequeno de Pastinha reconheciam no Coco uma “irmandade rítmica”, incentivando capoeiristas a aprenderem seus passos para aprimorar a musicalidade.
4. Resistência e Significado Cultural
Tanto o Coco quanto a capoeira foram marginalizados por séculos, associados à “barbárie” pelas elites. Sua persistência deveu-se à transmissão oral em quilombos e periferias:
- Codificação Cultural: Assim como a capoeira camuflava golpes em dança, o Coco transformava o trabalho exaustivo em arte, usando letras com duplo sentido para criticar a opressão.
- Espiritualidade: Ambos dialogam com o sagrado africano. O Coco, em versos como “Oi, alô ê ê, São Benedito!”, homenageia santos negros, enquanto a capoeira reverencia mestres e orixás.
5. O Coco na Capoeira Contemporânea
Hoje, a Dança de Coco é frequentemente integrada a eventos de capoeira, especialmente no Nordeste:
- Capoeira Regional: Grupos como o Cordão de Ouro incorporam passos de Coco em treinos para desenvolver agilidade e senso rítmico.
- Festivais Culturais: Em encontros como o Encontro de Culturas Tradicionais de Chapada dos Veadeiros, rodas de capoeira e apresentações de Coco dividem o mesmo palco, celebrando a diversidade negra.
- Educação: Projetos sociais usam ambas as práticas para ensinar história afro-brasileira, combatendo o apagamento cultural.
6. Conclusão: A Roda que Nunca Para
A Dança de Coco e a capoeira são fios de um mesmo tear cultural, tecidos com os sons dos atabaques, os versos dos griôs modernos e a resiliência de um povo que transformou dor em poesia. Nas palavras de uma cantiga de Coco:
“Coco é dança, coco é amor É a voz do negro resistindo com vigor!”
Enquanto houver rodas girando ao som do berimbau e do ganzá, a herança africana no Brasil seguirá viva, lembrando que, na capoeira e no Coco, cada passo é um ato de liberdade.